Poder Liberatórios dos Precatórios vencidos
Ao dispor em seu § 2º. do artigo 78 do ADCT advindo pela Emenda Constitucional 30/2000 que “as prestações anuais a que se refere o caput deste artigo, terão, se não liquidadas até o final do exercício a que se referem, poder liberatório do pagamento de tributos da entidade devedora” trouxe o legislador constituinte um direito (assegurado) subjetivo aos credores das Fazendas.
Ante o não pagamento, o valor do precatório ou da parcela, já possuem liberalidade de pagamento de tributos perante a entidade devedora, independentemente de pós-regulamentação da norma constitucional.
Não dispondo a norma de outra determinação, deve ser entendido o “poder liberatório” em seu sentido mais comum, qual seja, não pago o precatório a tempo e de modo próprio, este tem o poder de liberar seu titular do pagamento de débitos tributários para com a entidade devedora.
A própria Lei Fiscal, que regulamenta a cobrança do passivo fiscal (Lei 6.830/80) cujo artigo 11 dispõe sobre os bens passíveis de caucionamento em uma demanda fiscal, por ter sido promulgada em 1980, não previu referida forma de equacionamento fiscal, por não existir àquela época a norma promulgada somente em 2000 – EC 30/2000. Uma questão apenas temporal.
Porém, é possível sim o equacionamento de um passivo fiscal com o precatório vencido e não pago, pelo seu poder liberatório, conforme entendimento aposto pela 1ª. Turma do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do AgRg no AI 679.691 de relatoria do Ministro José Delgado.
Importante ressaltar que o termo “poder liberatório” tem sua origem na Magna Carta, não podendo, assim, oporse a dispositivos de menor hierarquia e cronologia anteriores à norma constitucional. Não pode uma norma infraconstitucional tolher direito outorgado pela própria Constituição Federal.
No contexto da norma constitucional, a extensão do conceito de “tributo” utilizado no § 2º. do art. 78 do ADCT deve ser interpretada em consonância com o artigo 3º. do Código Tributário Nacional (CTN), que define tributo como “(…) prestação pecuniária compulsória (…)”. Na interpretação conjunta das normas, e sempre respeitando a vontade do legislador constituinte, é correto afirmar que a palavra “tributo” deve ser utilizada e interpretada com o significado de ‘crédito tributário”, englobando desta forma todos os valores que o credor do precatório deve à Fazenda Pública.
A interpretação teleológica da norma, ao analisar a vontade do legislador constituinte, foi a de que o credor da Fazenda, face às mazelas e inadimplência contumaz Fiscal, pudesse receber, DE ALGUMA FORMA, o crédito que possuía para com a Fazenda, ainda que fosse perante o “o poder liberatório” do precatório.
Restringir o benefício ao sentido técnico da palavra “tributo” seria, novamente, beneficiar a Fazenda inadimplente.
Já com o advento da Emenda Constitucional nº 94, de 15 de dezembro de 2016, a compensação, como faculdade para o credor da Fazenda, passou a ser prevista no artigo 105 do ADCT, que dispõe: “Enquanto viger o regime de pagamento de precatórios previsto no artigo 101 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, é facultada aos credores de precatórios, próprios ou de terceiros, a compensação com débitos de natureza tributária ou de outra natureza que até 25 de março de 2015 tenham sido inscritos na dívida ativa dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, observados os requisitos definidos em lei própria do ente federado”.
Diante da inércia das Fazendas em regulamentar a matéria, o Congresso Nacional editou a Emenda Constitucional nº 99, de 17 de dezembro de 2017, que ao alterar e aperfeiçoar o Regime Especial de Pagamentos de Precatórios, acrescentou os §§ 2ºe 3º ao artigo 105 do ADCT e concedeu o prazo de 120 dias, a partir de 1º de janeiro de 2018, para que os entes devedores editassem a lei própria regulamentadora da compensação, sendo que após decorrido o referido prazo e constatada a inércia legislativa, os credores ficaram autorizados a optar pela compensação de seus créditos de precatórios com débitos existentes com o ente devedor.
Assim, independentemente da existência de norma legislativa regulamentadora, a utilização do precatório e seu “poder liberatório” é um direito subjetivo assegurado aos credores da Fazenda, que sem o efetivo pagamento do precatório, ficam de mãos atadas face à inadimplência fiscal.